junho 22, 2015

MARIANLVA DANTAS: A DAMA DA LIBERDADE

MARINALVA DANTAS
A DAMA DA LIBERDADE
A mulher que libertou mais de 2 mil escravos em pleno século XXI
Veio de uma família pobre, estudou e hoje luta pelo fim da escravidão
Auditora do trabalho, por dez anos autuou fazendas
com trabalho ilegal. Sua história virou livro
Ilustração: Divulgação

 Por
Thaís Herrero
ÉPOCA
 
Graças aos esforços de uma única brasileira, 2.354 pessoas foram libertas da escravidão desde 1995, um século depois da assinatura da Lei Áurea. Essa brasileira é Marinalva Dantas, auditora do trabalho e uma das maiores referências do país no combate à escravidão moderna e ao trabalho infantil. As histórias dessa mulher e dessas causas se misturam e estão contadas no livro A Dama da Liberdade, lançado na data do aniversário de 61 anos de Marinalva, 26 de maio. Resultado de cinco anos de pesquisa, o livro foi escrito pelo jornalista Klester Cavalcanti e publicado pela editora  Benvirá, 376 páginas.

A história de Marinalva teve uma influência crucial em sua carreira. Nascida em uma família muito pobre, em Campina Grande (PB), passou os três primeiros anos de vida em uma casa sem luz, água encanada ou esgoto. Por dentro, não havia banheiro ou paredes entre os quartos. Devido a uma crise grave de lombriga, foi levada à casa dos tios que tinham uma condição financeira melhor e acabou sendo criada por eles, em Natal (RN). Isso permitiu que Marinalva tivesse uma infância decente, bem diferente do que teria vivido se continuasse com seus pais.

Aos dez anos, foi visitar a família e reencontrar a mãe que já não reconhecia. Essa visita mexeu muito com ela, como contou em entrevista ao Blog ÉPOCA AMAZÔNIA. “Me dei conta de que era privilegiada e gostaria que todas as crianças – principalmente meus irmãos – tivessem um pouco do que eu tinha: a possibilidade de brincar e de estudar”. A experiência foi uma das bases para que ela crescesse como uma defensora dos mais fracos – como se define.

Marinalva entrou na faculdade de direito e passou em um concurso público para auditora fiscal do trabalho, em 1984. Pouco mais de dez anos depois, ingressaria nos primeiros grupos que saíram à caça de fazendas que mantinham trabalhadores em condições degradantes e sem direitos trabalhistas. Segundo levantamento apresentado no livro, os casos mais comuns de trabalho escravo estão em fazendas de pecuária (29% dos casos registrados pelo governo federal), cana-de-açúcar (25%). Dezenove por cento estão em fazendas com outras lavouras, como algodão. Os estados com mais casos são da Amazônia Legal: Pará (12.761 de escravos libertos desde 1995) e Mato Grosso (5.953). O perfil desses escravos explica sua vulnerabilidade: 62% são analfabetos e 27% estudaram no máximo até a 4ª série.
 
Como auditora do trabalho, enfrentou situações adversas e encontrou um cenário triste de constatar que ainda exista no Brasil. Viu fazendas em que os agricultores dormiam todos em um galpão, sem banheiro ou qualquer condição sanitária adequada. A comida era sempre escassa e quando ganhavam carne, eram sempre os piores pedaços, cheios de gordura e mal conservados. Em Marabá (PA), encontrou pedaços de carne que seriam consumidos no dia seguinte e estavam ao relento, infestados de moscas e em toras de madeira. A coloração quase preta do alimento a impressionou naquele dia.

Marinalva viu muitas crianças passando fome. E costumava dar a elas os alimentos que tinham no carro dos auditores do trabalho e da polícia federal. Encontrou um homem escravizado há dezenove anos e um menino que não sabia sua idade, pois nunca havia comemorado um aniversário. Questionado se tinha tempo para o lazer, esse menino respondeu que às vezes brincava de desmontar e montar a motosserra “cheia de pecinhas dentro”. Como conta uma passagem do livro, a auditora não sabia o que era mais triste: a criança não brincar por falta de tempo e de energia após um dia intenso de trabalho ou ter como brinquedo o mesmo equipamento que lhe roubava a infância.

Nem sempre era fácil se conter, em muitos capítulos do livro A Dama da Liberdade, Marinalva é retratada como uma mulher forte, porém emotiva, que se comeve e se revolta com o que encontra pela frente. Um dos poucos momentos em que chorou diante de um ex- escravo foi quando ele lhe contou que havia sido espancado por ter pedido um pouco de água limpa. A que tinha para beber vinha de um córrego e era amarela e barrenta. O chefe mandou que um peão, escravo como ele, fosse o autor das pancadas.

A luta de Marinalva a tornou uma personalidade conhecida. Ao longo dos anos apareceu em reportagens e deu inúmeras entrevistas. Descobriu casos de escravidão em fazendas de homens poderosos, como o deputado estadual do Rio de Janeiro Jorge Picciani. E, em 2002, a Polícia Federal encontrou em Marabá uma lista com nome de pessoas que deveriam ser executadas a mando de fazendeiros da região. Marinalva Dantas era um deles. Meses antes, ela comandara uma operação em uma fazenda de pecuária na região.
 
Em 2004, Marinalva foi para Brasília ser diretora da Divisão de Articulação de Combate ao Trabalho Infantil. O cargo mais burocrático do que prático não a agradou e ela voltou a Natal, onde até hoje é auditora. Olhando para trás, vê que a dedicação total à carreira teve impactos grandes também em sua vida pessoal, como o fim do casamento, desentendimentos com os filhos por passar tempo de mais viajando e até uma síndrome do pânico. Apesar de tudo isso, o trabalho a realizou sempre. Hoje, espera que todo o esforço tenha levado mais conscientização aos brasileiros para que não aceitem as barbaridades cometidas com trabalhadores sem direitos. E se diz uma otimista em relação ao fim da escravidão de uma vez por todas no país. “Eu não combatia o trabalho escravo e infantil até saber que isso existia. Depois que você descobre, quer que acabe. Não dá para aceitar que isso ainda aconteça na geração de nossos filhos e netos”.
 
...fonte...
 www.epoca.globo.com
 
Confira abaixo a entrevista que Marinalva Dantas
concedeu ao  Blog ÉPOCA AMAZÔNIA
  www.epoca.globo.com  
 
Se copiar textos e ou fotografias, atribua os créditos!
Os direitos autorais são protegidos pela Lei nº 9.610/98, violá-los é crime!

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Fiz uma visita e gostei!! Passa lá você também!!!