agosto 12, 2012

UMA SINFONIA ENTRE O SERTÃO E O ORIENTE

ORQUESTRA SINFÔNICA DO RN RUMO À CHINA
Variedade rítmica brasileira e a riqueza do cancioneiro musical nordestino
 Será a primeira  orquestra do Brasil a se apresentar no país oriental
Fotografia: Carlos Costa/Mossoró-RN
 
CHINA DE OLHO ATÉ NA NOSSA ORQUESTRA

Por
 Sérgio Vilar

A importância de uma orquestra sinfônica no contexto histórico-cultural e artístico de uma sociedade é indiscutível. E para um estado potiguar rico na tradição das bandas musicais, a orquestra figura como referência máxima. Em 2012 ela está mais presente no cotidiano cultural do Estado. Foram seis concertos realizados este ano - o dobro de 2011 - e já tem agendados mais três apresentações apenas neste mês de agosto. Um deles em parceria com o compositor Geraldo Azevedo, para centenas de pessoas presentes no Largo do Teatro Alberto Maranhão, no encerramento do Festival Agosto da Alegria.

A característica praticamente uniforme na constituição instrumental das orquestras (de formação tradicional europeia) possibilita peculiaridades às sinfônicas brasileiras e, mais ainda, às nordestinas. A variedade rítmica da música brazuca ou a riqueza do cancioneiro musical nordestino - muito presente na obra de Luiz Gonzaga - presentes no repertório das orquestras tupiniquins encantaplateias mundo afora. E foi este diferencial o mote para a Orquestra Sinfônica do Rio Grande do Norte ser a primeira do Brasil a se apresentar na China. O concerto histórico para o Estado potiguar está agendado para abril de 2013.

Mas antes de conquistar a China, a preocupação maior da OSRN é atrair cada vez mais o público potiguar. Quebrar o estigma de música elitista é o obstáculo. Para isso, a música erudita - quase sempre clássica - tem dividido espaço e acordes com chorinhos e canções regionais. "Este é o propósito da OSRN desde sua fundação. E hoje temos a meta de viabilizarmos três concertos mensais, sendo um oficial, um didático e um popular. Todos gratuitos", estima o atual diretor administrativo da OSRN, Luís Antônio de Paiva. Por ora, os concertos populares - em escolas, shoppings e praças - estão apenas no planejamento.

"Queremos tirar a Orquestra do teatro e levar à periferia. Por isso estamos incrementando o repertório com xotes, baiões, para aproximar o público. E já temos percebido a mudança de público. Já vemos até crianças presentes". Paiva ressalta que este será o repertório básico levado também à China. "Dessa forma queremos também entrar no calendário cultural do Estado; participar dos eventos festivos, a exemplo das festas juninas, e datas comemorativas. É uma maneira eficaz de tornar o trabalho da Orquestra cada vez mais perto de todos", ressalta o diretor, também músico e há 24 anos presente no cotidiano da sinfônica potiguar.

 ORQUESTRA SINFÔNICA DO RIO GRANDE DO NORTE
 Escassez de concurso público para contratação de novos músicos
Fotografia: Carlos Costa/Mossoró-RN

REGULARIDADE

Luís Antônio Paiva dirige o novo momento da história da OSRN. A regularidade de concertos não é à toa. Desde abril a Fundação José Augusto acatou a solicitação e hoje os próprios músicos escolhem o diretor e o regente da Orquestra. A dinâmica, o aprendizado e as condições de trabalho melhoraram. O resultado apontado por alguns integrantes foi a substituição da figura do burocrata pela do músico de carreira, mais inteirado da realidade que os cerca. "Foi uma conquista dos músicos da OSRN junto ao Sindicato dos Músicos do RN (hoje presidida por Ricardo Antão)", comemorou o diretor. 

ORQUESTRA SINFÔNICA DO RIO GRANDE DO NORTE
Um concerto histórico para o RN  está agendado para 2013
 Fotografia: Argemiro Lima/Novo Jornal
 
FALTA SALÁRIO, FALTA MÚSICO
  
Ainda assim há outros lamentos. O salário dos músicos da OSRN gira em torno de R$ 3 mil - compatível com a realidade das outras orquestras nordestinas, mas muito aquém das sulistas, com média salarial de R$ 8 mil a R$ 10 mil. "A Osesp, por exemplo, paga R$ 13 mil. Então há uma debandada de músicos para lá ou para o estrangeiro. A Orquestra é uma espécie de seleção. Então os mais talentosos recebem propostas melhores e vão embora", disse Luís Paiva. A outra reclamação é a escassez de concurso público para contratação de novos músicos.

Hoje faltam 23 no quadro da Orquestra, mas o diretor pondera: "Repomos essas faltas com contratações temporárias. É uma forma de gerarmos melhor intercâmbio com músicos e aprendermos com eles. Na verdade esta é uma tendência mundial. Por outro lado os contratos temporários não nos permite termos estabilidade ou planejarmos temporadas. Então, o ideal seria mesmo o concurso público", conclui. 

 ORQUESTRA SINFÔNICA DO RIO GRANDE DO NORTE
Uma seleção de talentosos músicos norte-rio-grandenses
 Fotografia: Rodrigo Sena/Tribuna do Norte

CANÇÕES POPULARES NORDESTINAS CAIRAM NO GOSTO DOS CHINESES
  
O CD da Orquestra composto por músicas populares nordestinas foi o grande atrativo aos ouvidos chineses. O palco deve ser o suntuoso teatro de Beijim. E a música potiguar atravessará o Atlântico junto com os músicos. No repertório, peças do carnaubense Tonheca Dantas e do taipuense K-Ximbinho, entre clássicos do cancioneiro nordestino e peças chinesas. Mas até a viabilidade do concerto muito acordo e acordes rolaram por debaixo do palco. O embrião partiu da esposa de Luís Antônio de Paiva, a cantora Sibelle de Luna. Ela trabalhou com o maestro Manoel Martins, em Curitiba, especialista em Villa Lobos. O maestro mantinha contato com o colega regente Linus Lerner, gaúcho com trabalho de regência em orquestras no mundo inteiro e radicado nos Estados Unidos há dez anos. Manoel repassou um Cd com trabalho de música regional da OSRN a Linus, e deste aos músicos chineses.

A praticamente entrega da administração da Orquestra aos próprios músicos foi crucial nesse processo. O sistema de revezamento de maestros, iniciado em abril, possibilitou o convite a Linus Lerner. Foi ele o regente do último concerto e permanece hoje como o maestro da sinfônica potiguar. Um dos músicos da OSRN, Paulo Sarkis, disse que Linus tentou levar as sinfônicas de Curitiba e Porto Alegre ao mesmo palco chinês, sem sucesso. "Eles rejeitaram por serem triviais", disse.

A China possui um programa bancado por empresas e governo responsável pelos concertos de sinfônicas e grupos de dança de diferentes partes do mundo, geralmente apresentados em grandes teatros e em datas comemorativas, a exemplo do ano novo. "Eles rejeitam clássicos de Mozart e Beethoven, por exemplo, porque orquestras austríacas e alemãs fazem isso bem melhor. O programa chinês é voltado para essa excelência musical da cada povo. E nossos ritmos populares entraram no gosto deles".

 ORQUESTRA SINFÔNICA DO RIO GRANDE DO NORTE
"Nossos ritmos populares entraram no gosto deles"
 O programa chinês é voltado para a excelência musical da cada povo
 Fotografia: Carlos Costa/Mossoró-RN

REPERTÓRIO

Sarkis já adianta mais ou menos o repertório a ser mostrado: "Basicamente o mesmo do nosso último concerto, quando tocamos peças nordestinas como a gonzaguiana de Ciro Pereira, a suíte nordestina de Duda, Royal Cinema de Tonheca Dantas com arranjos de Gilberto Cabral. E deveremos acrescentar um choro de K-Ximbinho, outro potiguar, além de duas peças chinesas. E por aí vai". O concerto estava agendado, inicialmente, para dezembro. Segundo Sarkis, há um processo lento e burocrático de envio de passaportes e crivos para imigração.

 ORQUESTRA SINFÔNICA DO RIO GRANDE DO NORTE
Maestro brasileiro radicado nos EUA, regente e diretor artístico 
de orquestra no Texas, Linus Lerner é o responsável 
pelo intercâmbio da Sinfônica do RN com a China
  Fotografia: Rodrigo Sena/Tribuna do Norte

SAIBA MAIS

A Orquestra Sinfônica do RN foi criada através do Decreto n.6874-A de março de 1976 por iniciativa do então Secretário de Educação e Cultura, João Faustino, passando a pertencer aos quadros administrativos dessa Secretaria. O primeiro regente foi o Maestro Mário Câncio Justo dos Santos, que organizou e regeu a orquestra por 10 anos. A princípio contava com um quadro de 23 músicos - apenas cinco residiam na cidade - executando um repertório barroco e camerístico. Em 1989 é integrada à estrutura básica administrativa da Fundação José Augusto, pelo Decreto n.10.338 e ingressam nela jovens músicos norte-rio-grandenses formados principalmente através do projeto UFRN-CSU da Cidade da Esperança, além de vários professores da UFRN que atuavam no projeto. O professor e maestro Oswaldo D'Amore passa a ser o novo regente, cargo no qual permaneceu durante 20 anos. A orquestra se amplia e passa contar com 60 músicos. Em 2007, assume a regência o maestro André Muniz. O padre Pedro Pereira foi último regente da OSRN, tendo regido a última apresentação da OSRN em dezembro de 2011, quando pediu demissão e a administração da Orquestra foi entregue aos músicos, que estabeleceram sistema de revezamento de maestros. 
 

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