julho 30, 2011

CASCUDO: UM POTIGUAR, UM BRASILEIRO

 30 de julho de 2011, 25 anos da morte de Câmara Cascudo
fotografia: Carlos Lyra

   LUÍS DA CÂMARA CASCUDO E O FOLCLORE BRASILEIRO
O responsável por tornar conhecidas as figuras fantásticas de nossas lendas!

Por
Carolina Benjamin

"Luis da Câmara Cascudo, Natal”. Assim eram endereçadas as cartas ao morador mais ilustre da cidade, que não precisava de número ou CEP. Também pudera: com tantas placas de bronze -- marcadas com seu nome e data de nascimento -- enfeitando a entrada da casa onde vivia, encontrá-la era tarefa simples. Mas não pense que ser reconhecido e respeitado entre os conterrâneos foi moleza, não! Sabe qual foi o motivo de tantas honrarias?

Câmara Cascudo foi o principal responsável por tornar conhecidas figuras fantásticas do folclore brasileiro. Atire a primeira pedra quem nunca ouviu falar em saci-pererê, curupira, mula-sem-cabeça e outros personagens do nosso folclore! Conforme ouvimos as histórias, parece que esses seres começam a morar na nossa imaginação...

Câmara Cascudo com a neta Daliana e o neto Newton
fotografia: Carlos Lyra

Nascido 1898, Luís era diferente dos garotos de sua idade. Ele passava a vida sentado: via figuras, lia livros, ouvia histórias e contemplava paisagens. Esse hábito acabou lhe despertando para o que veio a ser a matéria-prima de seu trabalho, o povo brasileiro.

Seu plano era conhecer a fundo o que era realmente nosso, coisa que não estava registrada nos livros e não era ensinada nas escolas. Queria saber as histórias de todas as coisas do campo e da cidade; queria conviver com os humildes, os sábios, os analfabetos; queria conhecer os mistérios, as assombrações. Encontrava no folclore um pouco de sua família e de todos com quem convivia, os pescadores, as rendeiras, os cantadores. Em toda sua vida, quase não saiu de sua cidade: ali encontrara o alimento para sua alma.

Ele estudava o homem a partir de sua história, das diferentes origens, dos romances, das poesias e, principalmente, do folclore. Luis da Câmara Cascudo se interessava por tudo, menos por matemática, que considerava sua inimiga. Aprendeu a ler em vários idiomas por esforço próprio: inglês, francês, alemão, italiano, espanhol, grego e latim.

 Câmara Cascudo na biblioteca de sua casa
fotografia: Carlos Lyra

 No auge de suas atividades, Cascudo estudava muito, sem nunca se afastar do corpo-a-corpo com os habitantes de Natal, seja nos bares, nas feiras, ou nas universidades. O segredo era passar noites em claro, recolhido em sua biblioteca até o amanhecer. E ele escrevia, como escrevia: era um livro depois do outro, sem respiração!

O caderninho de notas, que inicialmente servia para facilitar o trabalho, se transformou no mais legítimo registro da cultura popular brasileira: o Dicionário do Folclore . E foi assim, de anotação em anotação, que esse homem deixou uma vasta obra para o povo brasileiro. O assunto? O próprio povo e seus costumes!

Esse mesmo povo elegeria ele, Cascudo, como um monumento da cidade de Natal. Com mais de 150 livros publicados, ele era tão adorado por sua gente que muitas coisas na cidade levavam o seu nome: desde um terreiro de umbanda até o Museu de Antropologia da universidade!

Visita de Gilberto Freyre a Câmara Cascudo, em 1984.
Em pé, Fernando Luis (filho de Cascudo) e, sentada, Dona Dahlia (esposa)

Nascido em 30 de dezembro de 1898, filho único de uma rica família do Rio Grande do Norte, Cascudo -- cujo nome foi uma homenagem a Luís, rei da França -- teve uma infância de príncipe! Os pais, Francisco Justino de Oliveira Cascudo e Anna da Câmara Cascudo, já haviam perdido outras duas crianças, e nada nesse mundo os faria afastar do menino.

Na água do primeiro banho a mãe despejou um cálice de vinho do Porto para o filho ter saúde e o pai mergulhou uma moeda para merecer fortuna. Seus padrinhos -- veja só! -- eram o governador e a primeira-dama da província.

Conta-se que Luís da Câmara Cascudo era uma criança de saúde frágil, com pulmões suspeitos. Nunca foi de correr, subir em árvores, brincar livremente. Era vidrado pelo cotidiano, pelas coisas simples, pelos costumes dos homens a sua volta.

 Memorial Câmara Cascudo - Natal/RN
fotografia: Y. Masset

Na juventude, não largava o monóculo, a polaina e uma bengala da Índia. Era elegante, muito disputado pelas moças de Natal. Um dia, tinha na lapela um raminho de violeta quando avistou uma jovem menina de vestidinho azul e longas meias brancas. Mais tarde, substituiu a violeta por uma dália, em homenagem à sua nova namorada, Dáhlia Freire.

Pelo gosto do pai seria médico. Até tentou, mas seu caminho não era aquele, queria mesmo era escrever. Coronel Cascudo montou, então, um jornal chamado A Imprensa e, com apenas 17 anos, o rapaz já era repórter. Ali, fazia o que mais gostava: ia às feiras, mercados e procissões para registrar as coisas da cidade e descrever tudo o que via.

 Efígie de Luís da Câmara Cascudo  tendo a esquerda, cena de jangadeiros.
Reverso: Cena do "Bumba-meu-boi", bailado popular do folclore ...
 
Mais tarde optou também por estudar Direito. Com o diploma na mão, pôde dar início à carreira que tanto estimava, e pela qual gostava de ser conhecido: a de professor. Luís da Câmara Cascudo nunca deixou de estudar, e acabou se tornando uma enciclopédia ambulante.

Orgulhava-se de dizer que, em 50 anos de profissão, teve cerca de dois mil alunos, com os quais aprendera mais do que ensinara. O professor Cascudo preocupava-se em aproximar as disciplinas do dia-a-dia dos estudantes. Em sala, falava até de lobisomem, motivo pelo qual quase perdeu o cargo.

 A companheira, agora só, de um dos maiores folcloristas do Brasil
fotografia: Canidé Soares

Já com 68 anos, Luis se aposentou do cargo de professor para ter mais tempo para si. A saúde estava frágil e a audição, muito debilitada. Longe de desanimar, dizia que, como ele, os órgãos também tinham direito à aposentadoria. Em sua velhice, deliciou-se com os crepúsculos e os céus estrelados. Quando avistava a Estrela Dalva, acordava dona Dáhlia, sua mulher, em plena madrugada. E nunca abriu mão de ficar à vontade: sempre de sandália, pijama, e com os cabelos grisalhos todos despenteados.

Em 1986, Cascudo morreu em Natal, sua tão adorada cidade. O Brasil perdia um grande homem, que agora se transformava, ele próprio, em personagem da nossa história.

...fonte...
Carolina Benjamin
Publicado em 03/02/2004 | Atualizado em 02/06/2010
Instituto Ciência Hoje/RJ.

...fotografia...
Carlos Lyra
Y.Masset
Canindé Soares

 "Cascudo é muito comentado e pouco lido, 
o que gera várias inverdades sobre sua obra"
Daliana Cascudo 

...Câmara Cascudo - 25 anos de ausência...
...veja documentário...

Um comentário:

  1. Eu sou um carioca admirador deste potiguar ilustre que deixou para todos nós brasileiros, um inquestionável legado sobre nosso folclore. Agora em março, pela primeira vez visitarei Natal, e com certeza não deixarei de visitar o Museu Câmara Cascudo. Vou me maravilhar,com certeza !

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Fiz uma visita e gostei!! Passa lá você também!!!